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quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Baguncinha...

Acordei e fotografei o relógio cuco que marcava pouco mais de oito horas. Eu poderia escrever um texto sobre aquele cuco lindo, que foi do avô do meu marido. Eu poderia escrever sobre como ele realmente toca a cada meia hora, e  dizer que eventualmente me acorda, e que não me deixa ler tranquila no sofá, tic tac, tic tac...

Na sequência fotografei a mesa do café da manhã que estava posta desde a noite anterior. Também poderia escrever um texto sobre isso. Poderia falar sobre como eu adoro adiantar as coisas ou como adoro café da manhã e o que ele me representa. Tomar café da manhã todo dia com o marido me dá a sensação de comercial de margarina, parece vida perfeita, e é bom começar o dia com essa energia, mesmo sabendo do número de cliques necessários para fazer a fotografia - que nem perfeita fica. Imagina a vida, né?

Mas na foto da mesa do café insistia em aparecer uma baguncinha, imperfeita. Ali no cantinho, quase escapando pelo lado direito tinha uma confusão. Eram papéis, livros, canetas, fones de ouvido, post its. Bloquinhos de notas, segunda via do cartão de crédito, caixa de óculos e cartões de visita. Insisti no prato de sobremesa e na xícara de chá. Mas não adiantava, a bagunça estava ali. E estava aqui, em mim.

Era terça feira 08/11/16, dia que antecederia a minha demissão na empresa que trabalhei nos últimos quatro anos. Sim, eu já estava pressentindo. Sou dessas que lê os sinais, nesse caso bem escancarados... Ano difícil, sequência de demissões, rádio peão... Menos trabalho... Mais que isso, menos envolvimento, menos empolgação, menos coração, menos amigos, menos vida...

A baguncinha no canto direito da foto era a baguncinha que eu queria passar por cima, ou que eu havia deixado pra trás no ano de 2016. Foi um ciclo que foi terminando, no gerúndio mesmo. Uma vida feliz que foi perdendo as pessoas que faziam sentido pra mim. Foi perdendo o desafio e foi se tornando resiliência, preguiça, dor de estômago, alergia.

A baguncinha foi sendo capturada nos últimos 3 dias aos poucos, sem querer chamar muita atenção... Pega um livro daqui, outro dali. Verifica uns papéis, separa os objetos pessoais. Enfia tudo na mochila da academia e vai pra casa. Faz tudo de novo no dia seguinte, de forma a não ter que carregar nada de volta no fatídico possível dia da demissão.

No dia 09/11/16 deixei o meu trabalho mais sexy. De volta em casa peguei toda a baguncinha que estava sobre a mesa, acumulada nos últimos dias, e transferi para a cadeira, e parei de enxergar tudo aquilo. Não me despedi, não mandei meu e-mail com meus contatos, eu simplesmente sai pra fazer meu demissional. Mas a baguncinha ainda estava aqui.

A querida start up que comecei a trabalhar há 4 anos não é mais a mesma. Faz tempo. Tinha virado pra mim um trabalho normal... Tinha deixado de ser um sonho. Tem coisa mais sonho que os ventos que geram energia? Pode existir um trabalho mais legal do que uma empresa de geração de energia renovável criada por dois amigos, e onde todo mundo é jovem e interessante? Onde tem fruta cortadinha no meio da tarde e o presidente sabe o nome de todos? Onde a academia é um benefício e os mandamentos poderiam ter sido escritos por você? Pois é... Por três anos foi nesse lugar que eu trabalhei. E fui realmente feliz. E dizia com o maior orgulho do mundo "trabalho numa empresa de geração de energia renovável", e com a mesma felicidade me empolgava nas reuniões semanais com o presidente, e até achava descolado o perrengue que era chegar no semi árido baiano e ver a operação dos parques eólicos. Adorava ter muitas curtidas no meu instagram onde eu aparecia menor do que já sou em meio a tantos aerogeradores monstruosos. Aquilo era a perfeição pra mim. Ter perspectiva sempre me fascinou. Como é bom saber o nosso tamanho real. Como é bom ter a noção de não ser quase nada. Como é bom saber da nossa pequenez. Como é bom saber que a vida acontece no campo, na obra, na operação. E dentro dessa perspectiva onde eu sempre fui pequena eu tinha um orgulho enorme de pertencer aquilo tudo.

No último ano não fui a Caetité nem a Salvador . No último ano a maioria das pessoas interessantes saíram ou foram saídas, e deixaram pouco a pouco um buraco em mim... E foi acontecendo com uma frequência tão grande que eu já não sentia mais... Já não me importava mais - com a ausência - porque sabia que quem eu quisesse por perto eu manteria. Já não havia mais a mesma quantidade de trocas relevantes, já não havia mais cafés animados, já não havia ideias mirabolantes, nem reuniões atrasadas, já não havia mais a Renova.... Já não havia mais a Gabi do Planejamento Estratégico... Havia uma saudade, um pesar, uma angústia. Dor de estômago, alergia.

No dia 09/11 eu não derrubei nenhuma lágrima. Minhas gavetas estavam organizadas. Meu back up estava feito. Eu já não trabalhava mais na Renova Energia e estava tudo bem.

O cuco continua no seu tic tac, tic tac. Agora ele marca 23:45 da sexta 18/11. Estou sentada à mesa que já está arrumada para o café da manhã do sábado. Ainda tem uma taça de vinho que restou do jantar e que me acompanha até o final desse texto. E assim a vida segue, um ciclo termina e as vezes dói, mesmo quando a gente não quer olhar, e as vezes demora pra passar, mas sei que um outro ciclo vai chegar, assim que toda a baguncinha estiver devidamente organizada e eu pronta pra próxima.

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As fotos mencionadas se referem a uma lição de casa de um curso que estava fazendo na The School of Life. Eu achava que a foto seria mostrada no curso, ou que eu teria necessariamente que escrever sobre elas, então fui criando racionais para cada clique (quem me conhece sabe o tanto que eu adoro um racional).

Apesar do meu pesar, da dor de estômago, e da alergia eu sempre me importei com o negócio, aliás, essa minha resiliência não me deixa largar o osso, eu não teria desistido sozinha....

Não chorei ao sair da Renova, mas me deu um nó na garganta escrever esse texto que, será mostrado primeiro pra professora do curso que estou fazendo que se chama "como se encontrar na escrita". Cá estou tentando me encontrar, como sempre, como boa libriana. ;-)


Um comentário:

  1. Muito bom, Gabi. Não poderia ter sido escrito por mim mas super me identifiquei. A baguncinha também, está aqui ainda mas eu gosto que ela esteja assim, não resolvida, mal resolvida. Tava cansado de ter que sempre resolver toda a bagunça. Me dei conta que um pouco de caos faz bem. :)

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