Eu detesto aprender na dor mas admito que muito do que aprendi na vida foi com a dor, com o auto conhecimento.
As perdas da vida me fizeram ter atitudes de auto proteção. Quando meu pai morreu eu fui a forte. Sou vista como a forte até hoje. Naquele dezembro de 1998, do alto dos meus 17 anos (!!!) encarei a perda do meu pai de forma surpreendente. Não queria deixar de fazer as coisas esperadas de mim, tipo a prova do vestibular. Não queria chorar muito, isso demonstraria fraqueza. Não queria que minha mãe e meus irmão menores sofressem tanto. Fui criando em volta de mim uma bolha, que realmente me fazia sentir forte, mas não me deixava viver o que eu estava vivendo.
Me lembro da minha prima Caroline me ligar e eu não querer atender. Sabia que desmoronaria. Ela sabia que eu precisava daquele apoio. Mas mesmo assim me fiz de difícil. Não fui a velório e nem a enterro. Não queria ver meu pai pela última vez. Talvez não quisesse acreditar que tudo aquilo estava acontecendo. E lá foi minha mãe sozinha - nunca deixaria isso acontecer de novo. Fiquei em casa com os irmãos e recebi a visita dos meus amigos da escola, nunca vou esquecer deles comigo. Ainda assim não queria me abalar, 'não era assim que meu pai ia querer me ver'.
O tempo vai passando, e a bolha da proteção não consegue ser tão forte. A vida vem e o medo de perder alguém de novo é enorme. Se envolver com alguém e correr o risco de sofrer uma perda de novo? Não, obrigada! E quantas vezes na vida não me envolvi com namoradinhos, ou até com amigos mesmo, com a família (!!!) por medo da perda. E a perda vem. O avô velhinho se vai, a tia avó também, de vez em quando alguém muito novo morre… Ou alguém que está vivo se vai levado pela vida… E a perda dói, e é difícil sempre, e mais difícil ainda pra quem não quis passar por ela.
Ai a terapia, os livros, a vida, o auto conhecimento vão mostrando que não precisa ser assim. Não é preciso ser tão forte. Meus 30 anos me mostraram como eu sou eu, e como eu tenho que ser importante pra mim. Como eu tenho que ter valor pra mim, e como só assim eu terei valor pro outro, e que independentemente desse valor as pessoas vão e vem.
E graças a Deus eu "perdi" o meu avô Lauro depois dos meus 30 anos. Não, ele não morreu. Mas ele também não é mais o mesmo. Ele já não fica fazendo os jogos da mega sena, e nem tenta comprar um Audi, ou convencer a vovó de que o Fusca poderia ser o novo carro deles. Ele já não quer abrir uma garrafa de vinho, ok, acho que isso ele ainda quer lá no fundo, mas ele já não toma mais a garrafa de vinho, ou dá dicas sobre como escolher as frutas e legumes no mercado. O que ele tem, que sempre teve e sempre terá é o amor que passa pra gente.
E o que tudo isso tem a ver? Tem a ver com o fato de me permitir viver intensamente as coisas, sem o medo da perda, porque a perda virá. Já faz mais de 15 anos que meu pai morreu, e ainda tenho dificuldade de me envolver totalmente. Algumas pessoas conhecem meu lado bem frágil. Outras acreditam que eu seja uma rocha. No fundo a cada dia, a cada evento da minha vida ou da vida de quem me interessa me mostra que tudo sempre vai mudar, e a dor sempre vai existir…. MAS, a dor, a saudade, esses sentimentos só acontecem pra quem se permite viver. Pra quem se permite sentir. Pra quem efetivamente deixou o medo de lado e desencanou da proteção pra viver.
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